Quanto custava um cartucho original de International Superstar Soccer no SNES?

Quanto custava um cartucho original de International Superstar Soccer no SNES?

12 de julho de 2019 2 Por Allan Simon

Este blog pretende falar de games de esportes também. E nada melhor do que usar nossa seção “Quanto Custava?” para dar o pontapé inicial. Nos anos 1990, um jogo de futebol virtual passou a fazer parte da vida de uma geração de crianças e adolescentes que jamais esqueceriam as horas de diversão na frente de um Super Nintendo com o cartucho do International Superstar Soccer, o game da Konami que até hoje é referência sobre aquela década.

Se a série “Quanto Custava?” busca trazer com pesquisas e dados concretos as informações que a memória afetiva muitas vezes subdimensiona, ou mesmo supervaloriza, o caso do International Superstar Soccer é diferente. A ideia aqui praticamente foi confirmar uma lembrança muito clara: praticamente todos na vizinhança e na família possuíam cartuchos piratas, ou jogavam com cópias originais alugadas nas famosas locadoras dos anos 1990. Deveria ser muito, muito caro, comprar uma “fita” oficial.

Capa internacional do game da Konami – Foto: Reprodução

Encontramos anúncios de cartuchos originais do International Superstar Soccer Deluxe, versão melhorada do game e que chegou ao Brasil em 1996, nos jornais Folha de S.Paulo e O Globo naquele ano, dois anunciantes diferentes de cada região dos veículos. Ou seja, uma loja de São Paulo e outra do Rio de Janeiro.

No dia 2 de junho de 1996, a Folha de S.Paulo trazia um anúncio grande da loja Zarty Eletronics com cartuchos de Super Nintendo, o console 16-bit que no Brasil era fabricado e distribuído sob licença pela Playtronic, uma joint venture formada por Estrela e Gradiente três anos antes, quando apenas modelos importados do videogame chegavam ao país, então dominado pela Tec Toy e seu Mega Drive licenciado da Sega.

No destaque, o International Superstar Soccer em 3x de R$ 43 na Zarty Eletronics de SP

No anúncio, o mote era a promoção em três vezes sem juros no cartão de crédito. International Superstar Soccer estava entre os mais caros. O preço: R$ 129 à vista. Ou em três parcelas fixas de R$ 43. Antes de comparar mentalmente com o valor que você paga no Pro Evolution Soccer, atual game de futebol da Konami nos consoles de última geração, ou no Fifa, o líder em vendas na categoria, lembre-se que esta seção também serve para contextualizar os preços cobrados em suas épocas.

Acredite: um cartucho original do Super Nintendo estava custando mais de um salário mínimo. O valor em vigor no Brasil desde o dia 1º de maio de 1996 era de R$ 112. O país vivia praticamente dois anos de estabilidade monetária após a implantação do Plano Real, colocando um ponto final na era da hiperinflação que marcou os brasileiros na década de 1980 e nos primeiros anos 1990.

Usando o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), medida pelo IBGE, descobrimos que a inflação oficial entre os meses de junho de 1996 e 2019 foi de praticamente 298%. Com isso, o preço do cartucho na loja paulista equivaleria hoje em dia a R$ 513,38. Se o valor daquela época é equivalente a 115% do salário mínimo em vigor no ano de 1996, o preço atualizado representa pouco mais de 51% do mínimo atual, de R$ 998.

O valor de cada uma das três prestações, fixado em R$ 43, era equivalente a 38,4% do salário mínimo da época. Se dividirmos os R$ 513,38 em três vezes sem juros, chegamos a uma parcela de R$ 171,12, que fica pouco acima de 17% do mínimo atual.

No Rio de Janeiro, encontramos um anúncio com preço mais barato. Mas não havia parcelamento, o que nos leva a imaginar que os juros, sim, existiam no caso de São Paulo e estavam embutidos no preço à vista, que nem era o enfoque da propaganda da loja na Folha e aparecia bem pequeno abaixo da ilustração da capa do cartucho (pelo menos, o usuário ganhava um líquido para limpar CDs, isso era bastante destacado no recorte).

No dia 30 de junho de 1996, um anúncio da loja Casa&Video apresentava o International Superstar Soccer Deluxe por R$ 104,90 à vista. O valor atualizado com a inflação em 23 anos cai para R$ 417,47. Mas, ainda assim, a diferença segue. Na loja carioca, o cartucho saía por 93,6% do salário mínimo da época. O valor atualizado representa quase 42% do mínimo de 2019.

A Casa&Video também vendia o Super Nintendo em um pacote especial feito pela Playtronic que já vinha com International Superstar Soccer Deluxe incluso, além de dois controles, um adaptador e um cabo RF com comutador. Quem teve videogame nos anos 1990 sabe exatamente o que são esses acessórios. Para quem não viveu, não lembra ou não teve um console naqueles tempos, aí vai: eram equipamentos necessários para adaptar a máquina ao padrão dos televisores que eram vendidos no Brasil naquela época.

O preço do pacote, chamado pela Playtronic de “Super Set”: 329 reais à vista. Ou em seis prestações de R$ 66,99. O valor final na compra parcelada vinha com juros e ficava em R$ 401,94. Conclusão: comprar um Super Nintendo já com o jogo que marcou época e eternizou o “craque” Allejo na seleção brasileira dos videogames, custava quase três salários mínimos na compra à vista, e praticamente quatro na compra em parcelas, cuja prestação ficava em quase 60% do salário mínimo durante seis meses.

Nem vamos comparar aos preços atuais dos jogos de futebol, que costumam sair entre R$ 199 e R$ 300 de acordo com a versão, porque a diferença é enorme. Ali havia a obrigação de fabricar um cartucho, que nada mais era do que uma caixa de plástico que resguardava um chip com componentes eletrônicos que traziam o game na memória para rodar no console. Hoje em dia os jogos são distribuídos fisicamente em discos blu-ray, ou, principalmente, em mídia digital, sistema no qual o jogo sai de um servidor diretamente para o seu console por meio de tráfego de dados na internet.

O impacto do jogo na época

No mês seguinte, julho de 1996, a revista Placar trouxe uma página especial analisando os dois games de futebol mais famosos da época, o International Superstar Soccer Deluxe e o FIFA 96. Sobre o jogo da Konami, a matéria da Placar disse o seguinte:

“O International Superstar Soccer tem gráficos excelentes e continua uma coqueluche. A nova versão recebeu o título adicional de Deluxe e capricha nos detalhes. Dribles e comemorações são algumas das novidades. Até a pirueta que virou marca registrada de Cafu foi incorporada ao game. Há, também, a opção de mais seis times, todos de All Stars, e a possibilidade de se aprimorar como técnico. Na versão anterior, o treinador armava seu esquema tático por setores. Agora, é possível posicionar cada um dos integrantes do time” – Revista Placar, julho de 1996.

Quando menciona os seis times adicionais, a matéria esquece de citar o número de seleções que estavam disponíveis na versão anterior. Eram 26. A revista ainda destacou uma novidade do game no box “Que cachorrada!”.

“Para a galera, ‘cachorro’ é o insulto mais light que recebe um juiz que erra. No International Superstar Soccer Deluxe é possível se antecipar. Que tal transformar o árbitro num cachorrinho? Pegue o controle 2 e, ainda na tela de apresentação, aquela que pede para apertar o start, entre com o código BBXXAYAY, direita, esquerda e shift” – Revista Placar, julho de 1996.

Sobre o FIFA 96, a Placar destacava a presença de 16 clubes brasileiros (ao todo, eram 238 times e a possibilidade de criar campeonatos nos formatos “liga”, “torneio” e “playoffs”), mas cornetava a falta do Internacional. “A falha sobrou para o Rio Grande do Sul”, disse a revista.

Juiz cachorro no ISS Deluxe – Foto: Reprodução

A Placar já tinha falado sobre o International Superstar Soccer em sua versão original no ano de 1995. Na edição de agosto daquele ano, a revista destacou as principais novidades que o game da Konami representava no mercado de futebol virtual, que praticamente só tinha o FIFA, lançado em 1993, como uma boa opção.

“O International Superstar Soccer, para Super Nintendo, é o mais novo lançamento em games de futebol. São 26 seleções no cartucho. Há replay dos gols em câmera lenta, comemorações, provocações entre os jogadores, e até fotógrafos atrás do gol que às vezes levam boladas. Além de participar dos campeonatos, também é possível realizar um torneio de disputa de pênaltis ou treinar fundamentos como drible, passe e chute a gol. É só definir em ‘training’ e sair praticando. Neste game, você é o técnico. Substitui jogadores por outros em melhor forma física e escolhe a principal tática – (contra-ataque, linha de impedimento, todos na defesa ou todos no ataque) – de seu time. Nos jogos amistosos, há mais itens a selecionar. Você escolhe as condições climáticas – tempo bom, chuva ou neve -, um juiz mais tranquilo ou um mais severo e até alterar as regras, como deixar o jogo sem faltas” – Revista Placar, agosto de 1995.

Pirataria e locadoras

Sendo tão caro, o jogo só foi popular no Brasil porque a pirataria era constante e também pela prática de alugar cartuchos na locadora ser na época um hábito já consolidado no país.

O fim de semana de muita gente era formado por fitas VHS com os melhores filmes do cinema na diversão com os pais, e os cartuchos de jogos como o International Superstar Soccer, o Donkey Kong, Mario Kart, Super Mario, Sonic (no Mega Drive), Mortal Kombat, Street Fighter, entre tantos. O aluguel dos cartuchos era bem distante do valor pago para comprar uma cópia original.

Em 1993, por exemplo, a Folha de S.Paulo destacou que alugar uma fita custava no máximo CR$ 500. Usando o IPCA para atualizar esse valor até junho de 1996, pode-se entender que a locação ficaria em até R$ 6, no caso mais caro. Mas o normal para jogos mais popularizados e comuns era custar entre R$ 1 e R$ 3. Fazendo a atualização monetária, cada R$ 1 de junho de 1996 é equivalente a R$ 3,98 no dinheiro de hoje.

Os preços dos cartuchos piratas não foram encontrados em nossas pesquisas. Também nem seria fácil, afinal, pirataria não é coisa que se divulgue na mídia. Mas foi graças a ela que o tal International Superstar Soccer virou, por exemplo, o Futebol Brasileiro 96, que transformou as seleções do jogo em versões não oficiais dos times do Brasileirão daquela época.

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