O ano era 1971. A CBD (Confederação Brasileira de Desportos), a origem da atual CBF, pegava o modelo do Torneio Roberto Gomes Pedrosa e o adaptava para a criação do “Campeonato Nacional de Clubes de Futebol”, que seria disputado entre agosto e dezembro daquele ano. O Atlético-MG seria o seu vencedor. No dia 6 de agosto, chegava às bancas a edição número 73 da ainda jovem revista Placar, da Editora Abril, com reportagens especiais analisando o cenário do torneio que hoje conhecemos como “Brasileirão 1971” e seus 20 participantes. Com destaque para o Mercado da Bola.
A seção “Quanto Custava?” analisa agora os valores das negociações fechadas e dos rumores tidos como “sonhos” dos clubes do Brasileirão 1971. Aliás, se o Brasileirão não era chamado de “Brasileirão”, e sim de “Nacional”, também é interessante verificar que o que chamamos hoje de “Mercado da Bola” levava o nome de “Bôlsa de Jogadores”.
Sim, com acento circunflexo no “bolsa”. Entre os nomes destacados na seção dos “sonhos”, vamos relembrar e atualizar os valores dos passes, segundo a revista Placar, de jogadores como Pelé, Rivellino, Tostão e Jairzinho, que haviam sido grandes nomes do tricampeonato mundial da seleção brasileira no ano anterior, no México.
O cenário não era bom. Tanto que a matéria especial sobre os jogadores no mercado tinha o seguinte título: “Jogadores há. Mas o dinheiro é curto”. A reportagem destacava que a “bôlsa” até foi movimentada, mas com negociações de pequeno valor. A exceção era a contratação de Vaguinho pelo Corinthians, com passe vendido pelo Atlético-MG. O valor: 800 mil cruzeiros.
Como já explicamos no texto anterior da série, sobre a renda da final da Copa Rio de 1951, não poderemos usar o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), medido pelo IBGE desde 1980 e que hoje é o índice oficial de inflação no Brasil. Para uma data anterior a esse período, vamos novamente utilizar a correção inflacionária pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna), calculado pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) desde fevereiro de 1944.
Vamos começar pelos negócios efetivamente fechados. Transferimos os dados presentes na revista para uma planilha e aplicamos a correção monetária, colocando em ordem da mais cara para a mais barata, formando, assim, um ranking. Convém também lembrar que outras negociações fechadas posteriormente com o “Nacional” em andamento não entram nessa tabela, apenas aquelas já presentes na edição 73 de Placar.
Excluímos da lista os negócios feitos por empréstimo, e também aqueles que foram empréstimos com preço fixo de compra, mas que acabaram não sendo concretizados posteriormente, tendo sido devolvidos os jogadores aos clubes originais. No total, até a semana de início do campeonato, os clubes tinha gastado pouco mais de Cr$ 2,8 milhões no mercado. Corrigindo para os valores atuais, esse montante representa R$ 14,3 milhões.
Vamos agora aos “sonhos” descritos por Placar. As especulações viajavam ao ponto de Pelé, por exemplo, ser “cotado” no São Paulo. Mas é interessante verificar o preço dos passes. Para os mais jovens que não conhecem, passe era o vínculo jurídico entre uma agremiação esportiva e um atleta.
Se o clube não quisesse vender o jogador, poderia colocar um preço absurdo impagável. E se ninguém pagasse, ele não sairia daquele time. O passe foi extinto no Brasil pela Lei Pelé, em 1995, que o substituiu pelos direitos federativos, que só existem durante a vigência de um contrato assinado por tempo determinado. Por isso hoje os atletas podem sair de graça ao final dos seus contratos.
Os valores dos passes eram apurados pelos jornalistas da Placar. Pelé foi indicado com dois valores pela revista. Para ser vendido a um clube brasileiro, ele custava 6 milhões de cruzeiros. Na hipótese de sair para a “França” (única descrição feita pela reportagem no quadro especial), o valor subia para Cr$ 16 milhões.
Portanto, um ano após ganhar o tricampeonato mundial e já entrando na reta final de sua carreira como jogador do Santos, Pelé tinha seu passe avaliado em R$ 30,3 milhões para clubes brasileiros, mas de R$ 80,8 milhões para o exterior. Sempre ressaltando, esses valores levam em consideração a apuração feita por Placar em 1971.
Confira agora quais eram os “sonhos” do mercado brasileiro de jogadores há 48 anos. Só para se ter uma ideia do realismo dessas ilusões, o total delas, sem contar com a possível transferência de Pelé para o exterior, ficava em Cr$ 21,7 milhões (quase R$ 110 milhões). Perto de oito vezes o valor total gasto pelos clubes em contratações até então.
Como podemos ver, os valores de Rivellino e Tostão ficavam na metade de Pelé. E Jairzinho vinha logo após eles. Paulo Cézar Caju e Dirceu Lopes completavam a lista de passes milionários da época. O palmeirense Ademir da Guia, que já era um grande nome do clube nos anos 1960, mas ainda faria muita história vencendo o “Nacional” em 1972 e 1973, tinha passe avaliado em 700 mil cruzeiros, o que seria pouco mais de R$ 3,5 milhões no dinheiro de hoje.
Em tempo: a revista em questão custava Cr$ 1,50 nas bancas. Esse valor atualizado é de R$ 7,58.
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